Novidade

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quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Paixão poética

"As asas que Deus lhe deu
Ruflaram de par em par..."
(Alphonsus de Guimaraens)

Angelina, garota bela era ela,
O nome dizia tudo, nada mais,
Vivia na surrealidade de ser feliz.
Adorava poesias, aquelas profundas,
Lia Camões com a paixão de Azevedo,
Tinha tudo o que desejava, eram bem mimada,
Só não tinha o amor que lia...
E isso a desolava.

Todos os dias esperava o príncipe encantado
Até que em uma hora começou a se tocar.
Desistiu da metafísica, do que queria,
A sua felicidade se voltou ao consumismo.
Até mudou seu gosto poético:
Olavo Bilac agora a contentava.

Até que um dia, ao entrar na confeitaria
Viu tudo o que queria: o amor à primeira vista.
O rapaz entendeu e foi ao seu encontro.
Ficaram dois anos grudados, emaranhados,
No puro amor de quem é puro.
Parecia infinito, enquanto durou,
Porque infinito só as lembranças
No seu relicário, no seu estado de loucura.

O fim do relacionamento chegou, enfim.
E enfim Angelina se tocou de sua realidade:
Ao ler Alphonsus de Guimaraens
(suas mágoas eram derramadas nas poesias)
Viu que o que lia traçava seu destino.
Leu o primeiro poema, fechou o livro, sorriu, abraçou forte os pais,
Disse que ia dar uma volta pela praia
(Morava perto perto de uma praia deserta, com um farol abandonado).
O primeiro poema era Ismália.

E ela realmente enlouqueceu.
O garoto, sabendo de tal "passeio", a perseguiu.
Ainda a amava, agiu por impulso no passado.
Chegaram na praia, ela subiu no farol, recitando os versos
(Que memória, lera uma vez e já sabia de cor).
Ele a acompanhou, sorrateiramente.
A brisa era boa, uma lágrima caiu do olho direito
Daquela menina mulher, que vivia na surreal paixão,
Na felicidade.

Ela agora chorava de alegria,
Se encontrou no mundo, acordou.
Pena que ela acordou subindo a grade do farol.
Lá de cima, via o mar batendo nas pedras, que belo.
Sabia o que queria, era isso,
O mundo não precisa de mais sonhadores, ela dizia.
E assim, quando ela ia realizar o ato final,
Recitar a última estrofe do belo poema,
O moço apareceu, só deu tempo de gritar o seu amor à ela,
Mas ela não ouvia mais a realidade.
Abriu os braços, e em canto lírico recitou:
"Sua alma subiu ao céu,
Seu corpo desceu ao mar..."

E foi.
Pobre Alphonsus, não fazia tais apologias no poema.
Pelo menos agora Angelina, a surreal,
Era totalmente caracterizável pelo seu nome,
E nada mais.

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Memórias

E o passado tende ao esquecimento,
As memórias minhas se vão.
Do que já vivi, agora só restam as fotos,
Os risos, os sentimentos,
De um futuro promissor, a ilusão.

Agora só me resta sonhar
O escuro das minhas lembranças.
Ao acordar lembro-me de minha sina:
Viver sem do passado poder falar,
Tentando recuperar, em expectativas, as esperanças.

Minhas lembranças são ruínas,
Onde novas obras se instalarão.
Novos prédios são construídos
Para abrigar novas memórias, erguidas
Sobre o alicerce da alienação.

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Dia "feliz"

Hoje o dia foi feliz:
Levantei com o pé esquerdo,
De um pesadelo.
O café estava aguado, amargo,
O leite coalhado.
O chuveiro queimou,
Ensaboado, sem toalha
(Janelas esgarçadas).
Quase fui atropelado,
Pisei no chiclete,
Trombei com 5 pessoas
(Não acho mais meus cartões),
Peguei o ônibus errado
E a sequência de consequências:
Cheguei atrasado, o chefe brigou,
A mesa bagunçada, um sono.
Voltei para casa. Sem energia,
Celular sem bateria
(Depois descobri que meu chefe
Batera em um poste perto de casa).
Mas o dia ficaria melhor.
Fui ao encontro de minha amada
(Tomei uma multa, fui de carro emprestado).
Ela não apareceu.
Encontrei uma amiga, conversamos,
Bebemos (o vinho era bom, mas salgado),
"Você é como meu irmão" ela disse.
Depois dessa dupla decepção amorosa
Só o lar é seguro.
Contas, vizinhos barulhentos,
Troca de tiros na rua, um caos.
Passei o dia inteiro com o sorriso no rosto
No meio de tantas desgraças.
Ao cair na cama, já ao amanhecer,
Concluí que tive um dia de sorte:
"Pelo menos não estou no necrotério".